Por Sara Pelicano para CaféPortugal.pt
"Na Baixa de Lisboa, no século XIX, surgiram muitos locais de venda de ginjinha. Algumas destas casas dedicadas ao licor feito a partir da ginja mantêm-se ainda hoje um testemunho vivo da história da capital. Tornaram-se, também, um atractivo turístico. Visitámos algumas e provámos a ginja."
«Quero uma com elas»; «E eu sem elas». Assim gritam alguns clientes d’ A Ginjinha do Rossio, no Largo de São Domingos número 8, em Lisboa. Um pregão que Fernando conhece muito bem. Rapidamente coloca em cima do balcão de mármore dois copinhos de vidro. Da garrafa verte um líquido vermelho. Para um copo saltam duas ginjas, para o outro, nenhuma. Está servido o licor de ginja, a ginjinha, com elas e sem elas, ou seja com fruto e sem fruto.
A Ginjinha do Rossio é casa pequena fundada em 1840 pelo pai de Francisco Espiñeira Cousiño, um galego emigrado em Portugal. Em 1906 solicitou «o primeiro pedido de registo da marca Ginja Bebida Peitoral e Digestiva e do Licor de Hortelã Pimenta Superior, em que aparece no rótulo a imagem de um Zé Povinho com uma garrafa na mão», escreve Ana Marques Pereira no seu livro «Licores de Portugal (1880-1980)».
O consumo de ginja em Portugal é antigo e tradição enraizada na capital. No início do século XVIII seriam vulgares os ginjais em Portugal. Da sua fruta se prepara o licor com elevado grau de álcool e com alegadas funções medicinais. As ginjas «seriam especialmente valorizadas pelos seus atributos terapêuticos», acreditando-se que o fruto curava «ataques biliosos e acalmava os estômagos irritados».
Em Lisboa, na Baixa Pombalina, ainda se mantém viva a tradição de beber um copinho de ginja nas pequenas casas. Na Ginjinha sem Rival, fundada no último quartel do século XIX, manhã cedo entram os clientes de sempre. Bons dias quase sussurrados entre o Sr. Coelho, funcionário da casa há mais de 40 anos, e cliente. Sem mais delongas, Sr. Coelho coloca em cima do balcão o pequeno copo que se enche com o líquido vermelho escuro. Bebe-se de um trago e segue-se um «até amanhã».
Os clientes são fiéis e passam por aqui todos os dias antes de iniciarem os afazeres diários, mas as ginjinhas lisboetas são também atracção turística como descreve Ana Marques Pereira: «Presentemente são já muitos os turistas que procuram estes locais, misturando-se com os clientes habituais. Podem ver-se em pequenos grupos a beber uma ginjinha no exterior, procurando integrar-se nos hábitos nacionais, sempre denunciados pelas suas características identificadoras».
Na Ginjinha sem Rival os rituais são antigos e continuados pelo bisneto do fundador. Nuno Gonçalves não sabe a data precisa de inauguração da casa, sabe sim que sempre foi na Rua das Portas de Santo Antão, 7, e que o seu «bisavô trabalhava com o filho do fundador da Ginjinha Espinheira [A Ginjinha do Rossio] e que se zangaram e estabeleceu-se por conta própria».
À data, na Ginjinha sem Rival, além do afamado licor de ginja, faziam-se mais oito licores e três xaropes. «Tínhamos licores de banana, ananás, anis, granito, hortelã pimenta. Os xaropes eram de groselha, salsaparrilha e capilé», diz Nuno Gonçalves que pretende, em breve, revitalizar alguns dos licores como «a amêndoa amarga e hortelã pimenta».
À data, na Ginjinha sem Rival, além do afamado licor de ginja, faziam-se mais oito licores e três xaropes. «Tínhamos licores de banana, ananás, anis, granito, hortelã pimenta. Os xaropes eram de groselha, salsaparrilha e capilé», diz Nuno Gonçalves que pretende, em breve, revitalizar alguns dos licores como «a amêndoa amarga e hortelã pimenta».
Ao lado da garrafa de ginja colocada em cima do pequeno balcão está uma outra garrafa que tem um palhaço desenhado e inscrito o nome Eduardino. Ana Marques Pereira, no capítulo dedicado à ginja, escreve que «o licor Eduardino foi registado em 1908 como bebida peitoral.
Apresentava no rótulo a imagem do palhaço Eduardino, com as mãos abertas e vestido com um fato de bolas e uma gola de folhos. Este palhaço catalão trabalhou no Coliseu e era visita assídua da casa. Um dia misturou vários licores tendo obtido uma combinação agradável que fez sucesso, o que levou ao registo da marca com o seu nome».
Um pouco mais acima, no número 61 da rua Portas de Santo Antão, encontramos a Ginjinha Popular, nome registado desde 1933. À semelhança da Ginjinha sem Rival também aqui se produziam xaropes de groselha, salsaparrilha e capilé. A casa evoluiu e é hoje um restaurante onde ainda se vende ginja. Da arquitectura original e a contar a história está visível um placar de vidro pintado onde se lê: Ginjinha Popular.
Numa cidade com tantas ginjinhas é a receita que diferencia cada uma delas. Ingredientes certos serão claro, o álcool, o açúcar e as ginjas. Alia-se o seu carácter popular que «acabou por seduzir todos e transformar-se numa bebida sem género que ocupa um lugar especial no conjunto dos licores e no coração dos portugueses», conclui Ana Marques Pereira.
Numa cidade com tantas ginjinhas é a receita que diferencia cada uma delas. Ingredientes certos serão claro, o álcool, o açúcar e as ginjas. Alia-se o seu carácter popular que «acabou por seduzir todos e transformar-se numa bebida sem género que ocupa um lugar especial no conjunto dos licores e no coração dos portugueses», conclui Ana Marques Pereira.
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