A chuva convidou-se cedo à nossa jornada, obrigando-nos a levar à mão, as capas de água.
Vestiam-se quando vinha um aguaceiro, tirava-se quando a chuva passava e assim fomos alternando, até ao fim do dia.
Com 3 horas de caminho, recorri ao segundo par de sapatos. O peso das mochilas e os kilómetros começaram a manifestare-se nos pés.
Esta jornada prolongou-se bastante mais do que previsto, em virtude da Aldeia-Etapa, nos reservar uma surpresa.
Foto de Jorge Simao Meira
A pensão prevista “Dormidas Fonseca” indicada em Baraçal, não se encontrava na aldeia.
Ficava sim, na N. 102, a 4 ou 5 Km dali, para Norte, afastando-nos portanto da nossa rota, da mesma distância. Segundo informações recolhidas, “ali não havia nada onde ficar”. “Havia sim, em “Celorico-Gare, não longe da Estação de combóios”. Celorico-Gare, ficava a uns 5 ou 6 Km dali. A escolha foi fácil de fazer. Celorico ficava na nossa rota. Impunha-se naturalmente, continuar até Celorico-Gare, por aí haver pensão onde jantar e dormir. Eram cerca da 1 hora da tarde. Tinhamos já mais de trinta km percorridos, e o almoço ia tardar. Recorremos pois, às nossas “rações” de reserva para compor o estômago, até podermos satisfazer a essa necessidade de forma mais completa.
Cerca de uma hora mais tarde chegávamos a Celorico-Gare. Aí, outra surpresa nos esperava.
Havia onde dormir, como nos indicaram, mas uma única Pensão e estava repleta. As obras do IP2 trouxeram à localidade uma tal quantidade de trabalhadores, que nem um só quarto sobrava para turistas ou caminheiros de passagem. Deu para improvisar um almoço, com sopa e um prego no pão. Pudemos também descansar e verificar o estado dos pés. Depois de furadas e “alinhavadas” as bolhas, restava-nos perfazer mais 5 km até CELORICO DA BEIRA, com a esperança de encontrar um quarto onde nos pousar-mos para descansar e fazer a indispensável higiene... Confesso que, o sacrifício da Manuela, que se arrastava desde o início da jornada, as minhas bolhas inesperadas e a sensação de queimadura em partes do corpo que, por pudor não escrevo com as letras todas, e os trinta e tal kilómetros percorridos até ali, eram razões bastantes para aceitar ficar ali, nem que fosse só debaixo de umas escadas...
foto de Nuno Sampaio
Como por acaso, estas cidades e vilas do interior do país, ficam quase sempre situadas no cimo de colinas, cujo acesso nunca parce difícil quando viajamos de carro. Porém, nestas jornadas a pé, chegar lá, depois de ter percorrido algumas dezenas de km, mais parece o caminho da cruz.
Felizmente, o quarto desejado acabou por ser encontrado. A anunciada “Residencial Parque” acabou por ser encontrada depois de mais de 40 km percorridos, e havia quartos disponíveis.
Desta jornada ficará uma recordação para muito tempo, entre as muitas que guardamos.
Como a jornada se fez rude, houve consequências no corpo, entre as quais algumas menos
previsíveis, e que por pudor, evocarei ao de leve. Assim, foi necessário recorrer a uma coisa tão simples como pó-talco, que apesar de todos os cuidados, não tinha sido previsto na nossa indumentária de marcha. Depois de refrescados e de descansar um pouco, saímos para jantar. Visto as horas que eram (19H30) tornava-se difícil a pé, encontrar uma Farmácia aberta. No caminho para o restaurante que nos indicara o dono da pensão, passámos por uma Barbearia. O barbeiro varria o chão antes de fechar as portas. Como por reflexo, sem pensar, passei a estrada e dirigi-me lá. Disse as circunstâncias em que me encontrava, perguntei se tinha e se me podia ceder alguns gramas do “precioso” pó. Por Deus, tinha. Com um minúsculo papel, comecei logo a preparar um cone, onde havia de levar os poucos gramas que o barbeiro me cedesse. Mas o que se tornou caricato, foi que não só tinha, que veio de lá com um saco de 3 ou 4 Kilos.
Foto de Paulo Penicheiro
Deitámos um pouco de pó num saquinho, e lá vim eu todo contente com o talco que me arranjou, aquele que eu suponho, fosse o senhor BENTO, por ser assim o nome da Barbearia (Barbearia BENTO). Foi-me de grande utilidade ao longo da nossa caminhada esta dádiva. Digo dádiva, já que o senhor não aceitou qualquer valor em contrapartida."
Manuela e Horacio
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